Cadeirantes que buscam meios rápidos de locomoção nas cidades já podem ter acesso a uma alternativa ao carro e ao transporte coletivo. Um triciclo especial, produzido por uma fábrica em Mato Grosso do Sul, permite que deficientes físicos com membros inferiores sem mobilidade ou amputados tirem habilitação na categoria A, que inclui motos e triciclos.
Na última quarta-feira (7), o carioca José Henrique Domingues, de 59 anos, tornou-se o primeiro no estado a fazer a inclusão dessa categoria na Carteira Nacional de Habilitação (CNH), segundo o Departamento Estadual de Trânsito (Detran-MS). A bordo do triciclo especial, ele foi aprovado no exame prático realizado no pátio do órgão, em Campo Grande.
Domingues, que mora no Rio de Janeiro e trabalha como técnico em contabilidade, conta que é cadeirante há quatro anos, desde que começou a ter complicações por causa da esclerose múltipla. No ano passado, depois de ler sobre o triciclo especial, ele decidiu tirar a habilitação no Rio de Janeiro, mas esbarrou na desinformação.
“Cheguei ao Detran do Rio, mas lá ninguém sabia como aplicar as provas. Diziam que não tinha jeito. Juntei várias informações sobre o triciclo e protocolei um processo, aguardei quatro meses e não me deram resposta até hoje. Aí decidi viajar até Campo Grande para comprar o triciclo e tirar a carteira”, relata.
O Detran de Mato Grosso do Sul é o único a dispor de um centro de formação de condutores voltado aos deficientes físicos, de acordo com o órgão. As aulas teóricas podem ser feitas em centros convencionais, e as aulas práticas nas categorias A e B são oferecidas de graça pelo departamento. O centro possui automóveis adaptados e um triciclo especial do mesmo modelo que foi adquirido por Domingues.
“Ele começou como todo aluno, com dificuldades no início, achando que não daria conta. Agora ele está aí, aprovado”, diz o instrutor.
O examinador Sílvio Ângelo da Silva, que acompanhou as manobras do cadeirante no dia da prova, disse que ele não perdeu nenhum ponto durante o percurso. “Ele fez passagem de nível, conversão, obedeceu aos semáforos e às placas, trocou de pista, tudo de forma correta”, afirmou.
Após saber do resultado, Domingues disse esperar que outros cadeirantes como ele possam tirar a CNH da categoria A. “Isso vai beneficiar muita gente, porque é chato depender dos outros para tudo. Agora vou poder ir sempre que quiser à praia, ao centro da cidade.”
Características
O nome de “batismo” do triciclo é Biga, e o visual remete aos carros de combate usados na Antiguidade. O motor importado de 100 cilindradas pode desenvolver velocidade nominal de 80 km/h, mas o manual recomenda que o condutor trafegue em segurança a no máximo 60 km/h. O câmbio automático é composto por três marchas à frente e uma à ré, que são indicadas por luzes no painel.
A aceleração fica no punho direito, e os dois manetes acionam os freios. O manete esquerdo possui ainda um mecanismo que ativa o freio de estacionamento. Velocímetro, indicador do reservatório de combustível e buzina ficam no guidão. A capacidade do veículo é para apenas uma pessoa.
O cadeirante não precisa de auxílio de terceiros para usar o triciclo especial. Uma alavanca faz com que a plataforma seja rebaixada ao nível do chão, e corrimãos servem de apoio para subir ou descer do veículo. Travas garantem que a cadeira de rodas não se movimente durante a condução do triciclo. De acordo com a fabricante, o preço do produto é de R$ 15 mil.
Como um veículo zero
Segundo o idealizador e fabricante Oraci Silva da Costa, a ideia começou a sair do papel há cinco anos, quando ele se aposentou como professor de ensino industrial. O amplo conhecimento sobre mecânica e a paixão por motocicletas somaram-se à intenção de desenvolver veículos especiais. Desde então já foram comercializadas 13 unidades, sempre sob encomenda.
As peças não são reaproveitadas de outros veículos. “É o único triciclo do país totalmente projetado, diferentemente de outras motocicletas adaptadas para cadeirantes”, explica Costa. A vantagem, segundo ele, é que o triciclo sai da linha de montagem com o Registro Nacional de Veículos Automotores (Renavam). “É como um carro zero quilômetro que se compra em uma loja”, afirma.
Fonte: G1