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ONU – Países Aprovam Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência.

A diferença para milhões de pessoas.
Jornal Diário de Notícias – Portugal.

Após 5 anos de negociações, 192 Países acordaram nas Nações Unidas uma nova Convenção para proteger os direitos das pessoas com deficiência, primeiro tratado aprovado na área dos Direitos Humanos do século XXI.

“Esta é a primeira Convenção com esta magnitude para este século” e “a mensagem que queremos transmitir é que todos devem ter uma vida com dignidade e que todos os Seres Humanos são iguais”, disse o Presidente da Assembléia Geral, Jan Eliasson, após ter-se chegado a acordo na última sexta-feira [25 de Agosto de 2006], pelas 20.00h, hora de Nova York.

“Hoje é um marco importante para as Nações Unidas e para as Pessoas com Deficiência”, palavras do Embaixador Neo-zelandês Don MacKay, que presidiu às últimas sessões do Comitê Ad-hoc responsável pela elaboração do texto da Convenção. “É uma boa Convenção e fará a diferença para milhões de pessoas”.

O sucesso do acordo do tratado, após 2 semanas de intensas negociações e compromissos que cobriram anos de esforço, foi seguido de aplausos das quase 2 centenas de delegações governamentais e 8 centenas de representantes de ONGs de pessoas com deficiência, que participaram neste processo de construção de um pacto de 42 artigos.

Esta Convenção não visa criar novos direitos, mas proíbe especificamente a discriminação sobre as pessoas com deficiência em todas as áreas da vida. Os Estados acreditam que esta Convenção, no entanto, era necessária porque as pessoas com deficiência continuam a representar um dos mais marginalizados grupos da sociedade e que os seus direitos têm sido muitas vezes ignorados ou negados em muitos países do Mundo.

O tratado será agora enviado formalmente para a Assembléia Geral para adoção já na próxima sessão, em Setembro. Após este processo seguir-se-á a assinatura e ratificação por todos os países.

 
Histórico da Convenção.

A idéia da convenção tinha sido lançada pela Itália há cerca de 20 anos, mas nunca vingou, até que o presidente mexicano, Vicente Fox, a recuperou no seu discurso de 2001, perante a Assembléia Geral. O presidente conseguiu mobilizar apoios que conduziram à criação do Comitê Especial, cujos trabalhos decorreram de 2002 até agora.

O texto aprovado será agora revisto por juristas e traduzido nas línguas oficiais da ONU, esperando-se que venha a ser aprovado na próxima Assembléia Geral. Entrará em vigor quando for ratificado (por um número de países ainda não determinado). A ratificação vinculará cada país, que deverá adaptar a respectiva legislação nacional à substância da Convenção.
Texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

 
Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência é concluída com a participação histórica da sociedade civil.
Regina Atalla.
CVI Brasil.

Ao iniciar a Oitava Reunião do Comitê Especial da ONU para instituir a Convenção Internacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência, o Presidente Dom Mackey, destaca que esta ultima e tão esperada sessão conta com a presença de 800 ativistas da sociedade civil de todas as partes do mundo, dispostos a participar ativamente do processo de conclusão deste Tratado Internacional que consumiu quatro anos de dedicação e esforço e que tem um significado histórico para centenas de milhões de pessoas com deficiência de todo o planeta.

No dia 26 de agosto, a BBC publica matéria de Geoff Adams, na qual destaca palavras do presidente no seu discurso de encerramento. Dom Mackey ao saudar o acordo, declara: “Desejo agradecer aos colegas da comunidade de pessoas com deficiência por terem iniciado o processo e permanecido nele o tempo todo”. E acrescentou: “Como dizem as pessoas com deficiência, ‘nada sobre nós, sem nós’. A Convenção obrigará os Estados a desenvolverem um modo diferente de pensar em relação a deficiência”. “Uma vez adotado o novo paradigma, e as pessoas adotarem a abordagem do ‘podemos fazer’ no lugar do ‘não podemos fazer’, todo um volume de outras coisas fluirão a partir daí”, acrescentou Don MacKay.

Entre os 800 ativistas, incluíram-se cerca de 40 participantes do Projeto Sul, oriundos em sua maioria da América Latina e de alguns países da África e Ásia, que puderam imprimir a realidade dos países em desenvolvimento ao conteúdo desta Convenção Internacional. Desenvolvimento Inclusivo, Cooperação Internacional, Monitoramento, Situações de Risco, Indígenas, Acesso a Justiça, Proibição a Tratamentos Forçados, Mulher e Criança, foram alguns dos Artigos sobre os quais as lideranças do Projeto Sul investiram muita energia e trabalho para assegurar uma redação consistente aos nossos propósitos e necessidades.

 
Reunião dos participantes do Projeto Sul.

Ao lado de mais 5 brasileiros que representavam o Instituto Paradigma, a Escola de Gente e a 3 INN, estava a participação do CVI Brasil, através da sua Diretora Regina Atalla e Flavia Vital, presidente do CVI Araci Nallin (São Paulo). Discutíamos estratégias da sociedade civil frente à agenda do dia e também junto às delegações oficiais dos governos.

A hora do almoço era destinada aos encontros informais e as reuniões do Grupo dos Países da América Latina – GRULAC, do qual participamos ativamente e que sempre mantiveram as portas abertas e o respeito e consideração as propostas apresentadas pela Sociedade Civil Latino-americana.

Após o encerramento das sessões oficiais, as 18:30h eram realizadas as reuniões diárias do Projeto Sul, para tratar da avaliação das atividades do dia e para preparar a atuação do dia seguinte. Foi este ritmo intenso que conduziu a nossa atuação, dia após dia, durante 13 dias de trabalho, incluindo 10 dias de sessões formais do Comitê Especial, 2 dias dedicados ao Seminário do Projeto Sul e mais 1 dia, um belo domingo de sol, dedicado a reunião da Coalizão Internacional sobre Deficiência – CAUCUS, do qual participam mais de 80 ONGs Regionais e Internacionais de pessoas com deficiência e de direitos humanos.

 
Reunião do GRULAC com a participação da Sociedade Civil.

Havia a convicção geral, entre os participantes, principalmente no meio da sociedade civil, de que este período de trabalho seria especialmente atribulado devido ao compromisso de concluir o texto de trabalho e finalizar o processo de negociação e redação da Convenção Internacional, restando resolver temas cruciais e muitas vezes polêmicos.

Este tratado, ao envolver a expressiva participação de 192 países, com culturas muito diversas, vários idiomas e regimes políticos diferentes e antagônicos entre si, insere ao processo de negociação a dificuldade inerente de alcançar o pretendido consenso. Do total de 42 artigos, somente o artigo de Situação de Risco foi à votação, todos os demais resultaram de árduo, intenso e perseguido entendimento consensual.

Como prevíamos, nós da sociedade civil, ao inicio da segunda e ultima semana de trabalho as negociações sobre os principais temas endureceram. Definição de Deficiência e de Pessoa com Deficiência, Situação de Risco, Capacidade legal, Proibição a Tratamentos Forçados, Proteção a Integridade da Pessoa, Saúde sexual e reprodutiva e Monitoramento foram os temas mais difíceis. Reuniões e encontros informais se atropelavam a todo momento, principalmente após a suspensão da sessão oficial pelo seu presidente Dom Mackey, fato que ocorreu varias vezes durante os últimos dias, para que os coordenadores e os facilitadores dos diferentes temas reunissem as delegações envolvidas em busca de uma redação definitiva.

Iniciamos a ultima semana de trabalho dentro de um clima de muita pressão e tensão. Nos últimos dias, o CAUCUS publicou no seu comunicado diário que era melhor não ter definição a ter uma definição muito ruim. Fato que ocorreu após China, Austrália e outros países não admitirem uma redação de Definição de Pessoa com Deficiência na qual se incluísse a interação dos fatores externos como parte deste conceito, ou seja, fatores além dos estritamente médicos. Ao final, outros países que não apoiavam esta visão estreita, na qual se inclui o Brasil e Argentina, após longas batalhas travadas em seguidas reuniões, conseguiram chegar a uma definição que não é ideal, mas uma com a qual podemos viver.

 
Batalha de ultima hora assegura a menção aos indígenas.

Outro fato que merece destaque foi a inclusão da menção aos indígenas com deficiência, apresentado por meio da proposta solitária da Venezuela, na voz de Lênin Molina, que é pessoa com deficiência, ativista experiente e aguerrido. Apesar da defesa do Caucus e do Projeto Sul sobre a inclusão deste tema, havia entre as delegações governamentais uma apatia proporcional a dupla ou tripla discriminação sofrida por esta população. Este fato nos indica que há muito há fazer para combater esta inaceitável e grave invisibilidade enfrentada pelos indígenas e pelas pessoas que vivem em zonas rurais e em situação de isolamento demográfico.

O artigo de Monitoramento foi um capitulo a parte, uma vez que demandava uma serie de dispositivos, com extensos detalhes e pormenores, tratados em reuniões intermináveis, para assegurar a conformação de uma ferramenta eficiente e efetiva para apoiar e fiscalizar cumprimento de todos os direitos inscritos na Convenção Internacional. De modo inédito, no campo das Convenções de Direitos Humanos, está citado neste artigo que especialistas com deficiência também deverão compor o Comitê Internacional de Monitoramento. Nada sobre Nós, sem Nós!

Ao final da aprovação dos últimos artigos, ainda restava pendente o Artigo sobre Situações de Risco, no qual os países árabes reivindicavam a menção aos territórios ocupados, tendo em vista se tratar de uma realidade muito presente e muito pungente vivida por aquele conjunto de Países. Houve muito protesto e resistência das grandes potências, principalmente dos Estados Unidos, mas a sua inclusão acabou decidida através do voto, que resultou numa votação histórica de quase unanimidade, pois dos 115 países presentes na hora da votação, 102 deles votaram a favor desta inclusão, 5 votaram contra e 8 se abstiveram.

 
Conclusão da Convenção Internacional.

Foi emocionante o ápice deste grande momento e a alegria contagiante de chegar ao final deste tratado internacional, que representa uma nova e poderosa ferramenta de defesa dos direitos das pessoas com deficiência e que contou durante todo o seu processo, de forma inédita, com ativa e cada vez mais numerosa participação da sociedade civil. Se comparássemos as delegações oficiais dos governos, cerca de 120, poderíamos afirmar que os oitocentos representantes da sociedade civil presentes a Oitava sessão, divididos pelo numero de países alcançava uma media de mais de 6 representantes da sociedade civil por país, numero que superava a participação oficial de varias delegações.

Apesar de todas as dificuldades inerentes que enfrentam as pessoas com deficiência, a participação dos ativistas da causa pela instituição desta Convenção, que tem o objetivo de assegurar direitos civis e políticos de forma clara e inequívoca, foi como onda irreversível que foi se ampliando com o tempo.

Temos que comemorar, pois terminamos uma fase importante na luta contra a discriminação e pela inclusão de pessoas com deficiência. Para os delegados que concluíram os trabalhos na ONU – que dizem ser esta a maior minoria do mundo e que ela foi empurrada para as margens da sociedade por demasiado tempo – a Convenção certamente será vista como um primeiro passo bem-vindo.

No entanto, é preciso lembrar, principalmente no meio da sociedade civil, que outra batalha se inicia para que os países ratifiquem e implementem esta Convenção, e que no caso do Brasil, devemos continuar ativos e participantes para que ela seja ratificada e implementada com a maior brevidade possível. Também é grande a responsabilidade, no âmbito do Brasil, em relação a divulgação, a implementação e a vigilância destes 42 Artigos que compõem este tratado que se espera possa vir a conferir mais dignidade as pessoas com deficiência, e o efetivo gozo de todos os direitos em igualdade aos demais cidadãos. Esperamos que um número cada vez maior de brasileiros com deficiência e sem deficiência conheçam e se apropriem desta Convenção para que passemos das palavras as ações.

Disponibilizado em: 26/08/2006.

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