Escolas de samba do Rio de Janeiro e de São Paulo trarão deficientes físicos e visuais como jurados e integrantes dos desfiles deste ano. A paulista Giovanna Maira, 25 anos, sempre gostou de Carnaval. A alegria dos sambas-enredo, a vibração da plateia e a importância dessa manifestação cultural tipicamente brasileira fizeram com que a jovem acompanhasse os desfiles desde a infância.
Mas, para ela, essa celebração não pode ser traduzida apenas como um espetáculo visual. Cega desde 1 ano e 2 meses, quando teve um câncer, a bela Giovanna, de olhos azuis penetrantes, curte o Carnaval através do som.
Musicista formada pela Universidade de São Paulo (USP) e cantora lírica, ela fará parte do primeiro grupo de jurados de bateria cegos do Carnaval paulistano, que vai estrear no sambódromo do Anhembi este ano. “Estou muito ansiosa porque a responsabilidade é grande”, diz Giovanna. A iniciativa, criada pela União das Escolas de Samba Paulistanas (Uesp) em parceria com a SPTuris, é uma das várias ações que visam incluir deficientes físicos e visuais nos desfiles do Rio de Janeiro e de São Paulo neste ano.
Junto de Giovanna, outros quatro deficientes visuais participaram de aulas teóricas, aulas práticas e avaliações para aprender como julgar uma bateria. “Esse quesito deve ser avaliado apenas pelo som, sem a influência de fantasias ou coreografias, por isso decidimos capacitar deficientes visuais para a tarefa”, explica Kaxitu Ricardo Campos, presidente da Uesp. Cada avaliador receberá R$ 400 por dia de trabalho, seja ele deficiente ou não. “A iniciativa foi muito bem recebida pelas escolas e pretendemos continuá-la ou até expandi-la no ano que vem.” Na pista onde acontecem os desfiles, outros deficientes físicos e visuais também prometem brilhar. A escola de samba Camisa Verde e Branco abrirá o Carnaval de São Paulo, na sexta-feira 17, com uma ala composta por 100 deficientes visuais e seus acompanhantes. A ideia partiu do carnavalesco Anselmo Brito, que possui somente 30% de visão e está na fila de espera para um transplante de córnea. “Inspirado pela minha própria dificuldade, resolvi retratar na avenida a importância da doação de órgãos”, diz Brito. Já a escola Unidos de São Lucas, do grupo de acesso, trará no desfile 30 deficientes físicos e mentais em uma ala especial e um cadeirante na comissão de frente, quesito que conta pontos. Deficiente físico desde o parto, o analista de sistemas Fernando Passos, 46 anos, vai entrar pela primeira vez no Anhembi já numa posição de destaque, na comissão de frente. A coreografia, garante, será a mesma para todos os integrantes, deficientes ou não. “Não há diferença. Saio da cadeira, vou para o chão e dou até pirueta”, conta Fernando, com orgulho.
No Rio de Janeiro, a Acadêmicos do Grande Rio deve emocionar os foliões com um enredo que fala sobre superação, após um incêndio ter destruído o barracão da agremiação dias antes do Carnaval de 2011. Uma ala do desfile será totalmente dedicada à superação no esporte e contará com atletas paraolímpicos. A escola também homenageará Clodoaldo Silva, maior medalhista da natação paraolímpica do Brasil, e a treinadora Georgette Vidor, cadeirante e titular da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência (SMPD) do Rio. “Estou muito feliz em poder participar desse enredo e os atletas paraolímpicos são o melhor exemplo de superação que a escola poderia mostrar”, disse Georgette. A secretaria também estuda disponibilizar novamente neste ano o serviço de audiodescrição dos desfiles. No ano passado, por dia de apresentação, 60 fones foram distribuídos para deficientes visuais, que puderam ouvir em detalhes a descrição da passagem das escolas. Bom seria se o caráter democrático e inclusivo do Carnaval se espalhasse para todas as esferas da sociedade.