Observo-o e espero que ele se recomponha um mínimo para que eu possa pelo menos conversar com ele. E quem sabe minorar o seu sofrimento de alguma forma. Ele melhora. Trocamos olhares e conversamos.
Os deficientes têm a passagem de ônibus franqueada por lei, e para isso precisam tirar uma carteirinha.
Tirar a tal carteirinha, em minha opinião, já é algo questionável em alguns casos. Têm alguns tipos de deficiências que são bem visíveis. Um cara como esse de quem falo, por exemplo, tinha uma perna bem menor do que a outra e jamais andaria sem muleta. Para ele locomover-se não é fácil. Digo isso, porque o que aconteceu com o sujeito foi humilhante. Viu-se obrigado a descer do ônibus porque o motorista simplesmente o enxotou, por ele ter se esquecido da carteirinha. Saiu sem ela de casa e foi humilhado. Teve que descer sem um puto no bolso num lugar onde não conhecia ninguém. Dá vontade de chorar mesmo. Nem que seja chorar de raiva. Do motorista, é claro.
E me solidarizo com o cara, nessa hora de raiva. Lembro-me da cara do motorista enquanto ele descia. O motorista, se não me falha a memória, da linha 501 (Osmar Cabral pra algum lugar), ainda esperou ele se sentar e num gesto, esfregando os dedos, perguntou ao deficiente se ele não tinha dinheiro. Sacanagem e da braba.
Não sei o que leva uma pessoa a se comportar como esse motorista. Sei que trânsito é algo pra lá de estressante e que é uma atividade em que qualquer um perde o controle, mas, sinceramente, não consigo entender que tipo de comportamento o rapaz da muleta possa ter tido que tenha deixado o motorista tão irado.
E depois, ora, francamente. Eu que ando de ônibus diariamente, quase todos os dias percebo que muita gente anda de graça no ‘busu’, inclusive, policiais fardados. E pra não generalizar contra os motoristas, vejo muitos deles educados e atenciosos. Talvez o deficiente tenha pegado o ônibus errado, ou melhor, o ônibus com o motorista errado.
Mas o deficiente chegou ao seu destino. Estava indo para o Centro de Reabilitação e dei-lhe três reais, o dindin que eu tinha disponível na carteira para àquela hora. E garanti-lhe que, no Centro de Reabilitação, arrumaria pelo menos mais 1,10 reais, o que seria suficiente para comprar a passagem de volta.