Uma pequenina mesa de jantar, rodeada de quatro cadeiras menores ainda, divide espaço com um sofá pouco convencional. “Tem tudo a ver com a gente”, resume Adriana Poci Cabral, 42 anos, 1,30 m, que comanda a loja Casinha Pequenina, no shopping Eldorado (zona oeste de São Paulo), junto com a irmã Mila Poci Cabral, 39 anos, 1,20 m. Quase todos os objetos da loja cabem na palma da mão. “Comércio é difícil, mas com esta loja [de miniaturas] quase não temos concorrência”, completa Adriana.
As irmãs contam que alguns clientes já ficaram desconcertados ao perceber que elas eram anãs. Mas isso é raro. Segundo Mila, boa parte deles vai lá para vê-las. “A gente é como um folclore”, diz, “às vezes levamos bronca porque não estávamos na loja. Muitos querem ser atendidos apenas por nós”.
Mas por trás dos sorrisos que elas espalham para os clientes, existe uma realidade menos ‘colorida’, compartilhada por outros anões.
“Outro dia saímos do ônibus e um homem, de dentro de um carro, chamou a gente de anãs de circo”, conta Adriana. “Eu não ligo muito, mas a Mila fica nervosa com as brincadeiras”. Adriana, entretanto, lembra de um caso que a incomodou. “Há uns 10 anos, eu trabalhava em uma loja de acessórios para banheiro, e era a minha vez de atender um cliente. Quando eu me apresentei, ele me ignorou, fingiu que não me viu. Eu passei o cliente para uma colega e fui chorar no estoque da loja”.
Com Kênia Hubner, 53 anos, 1,23 m, as histórias de preconceito se repetem. Ela e o marido Hélio Pottes, 53 anos, 1,33 m, são responsáveis pela associação Gente Pequena, uma organização inspirada na Little People of America, dos EUA, que estava inativa por duas décadas e renasceu há 3 anos.
Kênia é formada em enfermagem pela PUC (Pontifícia Universidade Católica). Quando foi procurar emprego com três amigas de estatura normal, elas avançavam no processo seletivo e Kênia era sempre desclassificada na primeira fase. “Rodei por 25 hospitais. Durante uma prova de classificação, a moça me perguntou, na frente de todo mundo: ‘por que você está fazendo isso? Como vai atender uma parada cardíaca?'”.
Ela trabalha há 28 anos no hospital Beneficência Portuguesa. Já empregada, Kênia ainda enfrentava obstáculos. “A diretora do hospital era muito questionada sobre a minha admissão. E parece que você tem que trabalhar dobrado, tem sempre que ficar provando que é capaz”, lamenta. “Com paciente nunca tive problema, mas quando eu subo na escadinha da cama alguns acham que eu vou cair.”
Com a filha Maria Rita, 17 anos, 1,25 m, os problemas foram na escola. “Ela não era aceita, as pessoas criavam dificuldade, mas não explicavam as razões”. Uma vez dentro da sala de aula, os pais explicavam que ela não precisava de carteirinha especial para estudar. “Os amiguinhos tratavam ela como boneca e até faziam sua lição. Ela, claro, aproveitava”, recorda a mãe.